O ser humano, ao longo da vida é obrigado a aprender a lidar com a rejeição, mas aquilo era qualquer outra coisa que não uma rejeição ou uma continuidade. Aquilo estava realmente acabando comigo. Nada mais me distraía. Eu não fui treinada pra lidar com a incerteza.
Pra sair dessa atmosfera sufocante, topei um convite de um conhecido pra um passeio no shopping.
E comecei a me arrepender a partir do momento que eu fui me encontrar com ele.
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Nada rolou até tarde da noite. No bar, minha linguagem corporal falava. Mas nem eu nem ele demos atenção à ela. Ele se aproximava e eu me afastava. Em determinado momento ele estava tão próximo, que se eu mantesse minhas pernas no chão ficariam entrelaçadas entre as dele. E então eu as mantive em cima da cadeira, em perna-de-índio.
O assunto passou a ser beijos. Entre uma cantadinha e outra eu me fazia de desentendida. Até que ele veio pra me beijar e eu pensei: "Ai caramba.. D:" e... eu não tive resistência nenhuma. Me mantive passiva. Não pensei nem senti nada com aquilo naquele momento. Não o abracei nem coloquei as mãos nele. Eu não sei, eu definitivamente não queria estar ali. E daí ele me chamou pro motel. E eu aceitei.
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Antes de continuar, eu gostaria de dizer que tudo foi consensual, e eu eximo o rapaz de qualquer culpa pelo que aconteceu.
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Fiz questão de que a luz fosse apagada pra não ter que olhar pra ele. A camisinha não foi só uma proteção pra DST: representava um contato bem menor com aquele membro que eu não queria, mas permiti dentro de mim.
Só se ouvia a respiração dele no quarto. A minha, eu prendia pra segurar o choro e o vômito. De olhos fechados, eu só queria que aquilo acabasse o mais rápido possível. E acabou.
Fumei um cigarro e dormi de costas pra ele, sem permitir que ele me tocasse. Acordei chorando. Com nojo. Dele e de mim.
Durante toda a manhã ele tentou começar alguma coisa e em todas eu fugia, fingia estar dormindo. Quando não pude mais fingir, sentei e acendi um cigarro, citei Alexandre Pires: "O amor só se mede depois do prazer". E isso, porque eu não tive prazer nenhum. E ele levantou puto:
- Aaaah! Que palhaçada!
Permaneci na cama, constrangida. Ele foi pro banheiro, respirou, pensou, se acalmou e disse:
- Eu até te entendo, já estive nessa situação. Mas é foda, né...
- Eu entendo você achar foda. Inclusive, acho que eu entendo muito mais você achar foda do que você me entende.
Ele definitivamente não me entendia.
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Voltei pra casa me sentindo um lixo. Com nojo de mim, dele, de sexo. Eu me perguntava "como eu fui capaz de fazer isso comigo? Eu, dona do meu corpo e das minhas vontades, como permiti me anular?"
Eu me permiti fazer sexo sem que eu quisesse. Eu me permiti ser estuprada. Eu, como humana, cometi um erro grave contra mim, e que sirva de aprendizado.
Enquanto isso, me concentro em resolver meus problemas pendentes. E enquanto não são resolvidos, me mantenho bem longe de outras pessoas. Até superar esse trauma que eu me causei.
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E é isso. Não tem lição de moral, não tem reflexão fofa. Só a narrativa crua da covardia que eu tive diante da situação.
Fui aquilo de que mais tenho medo. Fui minha própria violadora.